A constituição dos executivos municipais é porventura das maiores aberrações constantes no nosso edifício legislativo eleitoral. A actual lei prevê que a vereação municipal, cujo número oscila entre 5 e 13, de acordo com a população de cada concelho, seja eleita de forma proporcional pelo método de Hondt, sendo Presidente o cabeça de lista do partido ou coligação mais votado. Este sistema, leva a que os executivos municipais sejam compostos por elementos de diferentes partidos e tendam a transformar-se em mini-parlamentos, em claro prejuízo das suas verdadeiras funções. A inexistência de uma maioria absoluta de vereadores por parte do maior partido, facto recorrente em muitos concelhos, leva à constituição de coligações envergonhadas e quase nunca assumidas, atribuindo-se pelouros executivos a partidos da oposição, os quais raramente deixam de o ser por esse facto.
Outra perversão do sistema, reside na escolha dos candidatos, para o que relevam fundamentalmente critérios populistas ou de fidelidade ao aparelho partidário e, muito pontualmente, de competência para o exercício de funções autárquicas. Formam-se então listas muito heterogéneas, geralmente encabeçadas pelo antigo comandante da corporação local dos Bombeiros ou pelo ex-presidente do clube de futebol que é muitas vezes o patrão da maior construtora do concelho. Este ilustre e muitas vezes sinistro personagem irá fazer equipa com outros dinâmicos representantes da sociedade civil, geralmente os cabecilhas das organizações partidárias sindicais e juvenis, os populares “jotas”. Só por mero acaso emanará de tal lista um programa coerente de actuação municipal. Mesmo que tal aconteça, num ápice se lhe sobreporão os interesses das corporações que os diferentes membros representam, para cuja defesa se verão revestidos de legitimidade eleitoral, uma vez apurados para a vereação pelo método de Hondt. A actuação do Presidente da Câmara pautar-se-á pois por uma busca constante de equilíbrios, sendo obrigado a satisfazer interesses, geralmente pouco transparentes, seja dos vereadores do seu partido, seja dos outros partidos, cujo voto é muitas vezes indispensável para a aprovação de determinadas medidas.
Ao fim de mais de 30 anos com um tal sistema, a paz podre instalou-se e vemos todos os partidos a ele perfeitamente acomodados e “comendo” do orçamento numa base mais ou menos proporcional. Rui Rio é a única voz que vem bradando contra este estado de coisas, sem grandes resultados, diga-se.
Durante o governo Barroso, Santana Lopes coordenou a elaboração de uma proposta rectificativa que, com uma ou outra alteração de pormenor, veio a resultar no Projecto de Lei nº 431/X, apresentado já nesta legislatura pelo PS e PSD em Dezembro de 2007. Este Projecto de Lei, que se pensava vir a ser implementado já para as Eleições Autárquicas do corrente ano, viu a sua aprovação sempre retardada, com acordos e desacordos prévios entre o "centrão" de cada vez que o PSD mudava de líder e mantém-se ainda em "banho-maria". Diga-se que foi vantajosa a sua não aprovação, pois que as alterações nele consagradas eram, na generalidade, para pior. Acabava inclusivamente com algo que é positivo na actual lei, a eleição em separado do executivo e do parlamento municipais o que, se conjugado com uma clara definição de funções de ambos os órgãos, permite a saudável formação de contra-poderes e o estabelecimento de mecanismos de controlo.
O Projecto de Lei acima referido determina que o executivo sairá da Assembleia Municipal, sendo eleito presidente da Câmara o cabeça de lista do partido ou coligação mais votado para aquela. Independentemente da votação, o partido mais votado terá assegurada a maioria dos vereadores, devendo porém estes ser escolhidos apenas de entre os deputados municipais eleitos. Fica garantido que os partidos da oposição estarão representados na vereação, também a partir das respectivas bancadas municipais, fixando-se à partida o nº de vereadores a que têm direito, independentemente das votações relativas (nº 5 do Artigo 228º do dito Projecto de Lei), fazendo-se a sua distribuição por aplicação do método de Hondt.
Outra perversão do sistema, reside na escolha dos candidatos, para o que relevam fundamentalmente critérios populistas ou de fidelidade ao aparelho partidário e, muito pontualmente, de competência para o exercício de funções autárquicas. Formam-se então listas muito heterogéneas, geralmente encabeçadas pelo antigo comandante da corporação local dos Bombeiros ou pelo ex-presidente do clube de futebol que é muitas vezes o patrão da maior construtora do concelho. Este ilustre e muitas vezes sinistro personagem irá fazer equipa com outros dinâmicos representantes da sociedade civil, geralmente os cabecilhas das organizações partidárias sindicais e juvenis, os populares “jotas”. Só por mero acaso emanará de tal lista um programa coerente de actuação municipal. Mesmo que tal aconteça, num ápice se lhe sobreporão os interesses das corporações que os diferentes membros representam, para cuja defesa se verão revestidos de legitimidade eleitoral, uma vez apurados para a vereação pelo método de Hondt. A actuação do Presidente da Câmara pautar-se-á pois por uma busca constante de equilíbrios, sendo obrigado a satisfazer interesses, geralmente pouco transparentes, seja dos vereadores do seu partido, seja dos outros partidos, cujo voto é muitas vezes indispensável para a aprovação de determinadas medidas.
Ao fim de mais de 30 anos com um tal sistema, a paz podre instalou-se e vemos todos os partidos a ele perfeitamente acomodados e “comendo” do orçamento numa base mais ou menos proporcional. Rui Rio é a única voz que vem bradando contra este estado de coisas, sem grandes resultados, diga-se.
Durante o governo Barroso, Santana Lopes coordenou a elaboração de uma proposta rectificativa que, com uma ou outra alteração de pormenor, veio a resultar no Projecto de Lei nº 431/X, apresentado já nesta legislatura pelo PS e PSD em Dezembro de 2007. Este Projecto de Lei, que se pensava vir a ser implementado já para as Eleições Autárquicas do corrente ano, viu a sua aprovação sempre retardada, com acordos e desacordos prévios entre o "centrão" de cada vez que o PSD mudava de líder e mantém-se ainda em "banho-maria". Diga-se que foi vantajosa a sua não aprovação, pois que as alterações nele consagradas eram, na generalidade, para pior. Acabava inclusivamente com algo que é positivo na actual lei, a eleição em separado do executivo e do parlamento municipais o que, se conjugado com uma clara definição de funções de ambos os órgãos, permite a saudável formação de contra-poderes e o estabelecimento de mecanismos de controlo.
O Projecto de Lei acima referido determina que o executivo sairá da Assembleia Municipal, sendo eleito presidente da Câmara o cabeça de lista do partido ou coligação mais votado para aquela. Independentemente da votação, o partido mais votado terá assegurada a maioria dos vereadores, devendo porém estes ser escolhidos apenas de entre os deputados municipais eleitos. Fica garantido que os partidos da oposição estarão representados na vereação, também a partir das respectivas bancadas municipais, fixando-se à partida o nº de vereadores a que têm direito, independentemente das votações relativas (nº 5 do Artigo 228º do dito Projecto de Lei), fazendo-se a sua distribuição por aplicação do método de Hondt.
Isto representa uma aberração em termos de representatividade e uma autêntica promiscuidade entre dois diferentes órgãos que jamais se controlarão mutuamente. O eleitor estará formalmente a votar para um órgão (Assembleia Municipal), mas nunca saberá exactamente se os elementos da lista em que vota irão exercer as funções para as quais ele os mandata, ou funções executivas na vereação. No limite, poderá haver elementos a saltitar entre a Câmara e a Assembleia Municipal, em função dos humores do presidente da Câmara.
Em termos de competências para o exercício de funções executivas, nada muda face à situação actual, uma vez que a escolha dos candidatos para as listas à Assembleia Municipal será efectuada segundo a lógica dos aparelhos partidários e dificilmente o cabeça de lista conseguirá formar uma equipa coesa e da sua confiança para a vereação.
Outra alteração, que se afigura ferida de inconstitucionalidade, consiste na criação de deputados municipais de 1ª e de 2ª categoria, vedando aos representantes das freguesias a possibilidade de votar o orçamento camarário e moções de rejeição do executivo (vd. Artigo 3º do Projecto de Lei). Como exemplo de centralismo retrógrado, é difícil encontrar melhor.
A alternativa a uma tal aberração, e que não terá vingado nos partidos do bloco central, passaria por reformular o quadro de concelhos e freguesias com vista à sua redução e pela eleição uninominal do presidente da Câmara, se necessário a 2 voltas, que teria a faculdade de escolher posteriormente a sua equipa numa lógica de competências técnicas e políticas, em simultâneio com algum reforço dos poderes da Assembleia Municipal, entre os quais a capacidade de vetar os vereadores escolhidos. Mas isto representaria uma machadada nos aparelhos partidários e nas corporações que neles se abrigam. E quando se chega a uma situação de apodrecimento como a actual, a capacidade de auto-regeneração do regime desaparece.
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