Uma asserção que hoje ninguém discute e cujos fundamentos me custam a entender, é a de que os políticos em campanha não podem dizer a verdade aos eleitores, sob pena de os espantarem para outras paragens. A lógica prevalecente, desde há muito enraizada na mentalidade dos aparelhos partidários, é a da conquista do poder a qualquer preço, nem que para tal se tenha de prometer o paraíso na terra. Mesmo que tal se afigure irrealista, haverá que convencer o eleitor que só “o nosso partido” terá engenho, capacidade, brilhantismo para fazer o milagre económico e conduzir a Pátria de retorno a glórias passadas. Assiste-se então a todo um manancial de promessas que têm em comum o serem publicitadas apenas na óptica dos benefícios e dos beneficiários, jamais na perspectiva dos custos e na viabilidade do seu financiamento.
Eu julgo que existem duas razões de fundo para estas posturas recorrentes, uma de cariz filosófico, outra de natureza pretensamente mais racional.
A “razão filosófica” remete para as teorias keynesianas que se impuseram no pós-guerra ao nível das políticas governamentais. John Maynard Keynes, o pai daquelas teorias e talvez o economista mais influente do século XX, foi quem primeiro advogou a utilização do orçamento do Estado como instrumento de estabilização económica. A sua tese fundamental defende que, face a uma situação económica recessiva em que os agentes económicos se abstêm de consumir e de investir, deve o Estado substituir-se a eles e aumentar a chamada procura agregada através da despesa pública. Abram-se buracos nas ruas para voltar a tapá-los, é uma conhecida máxima de Keynes que procurava simbolizar a necessidade do investimento público para dessa forma criar empregos e aumentar o rendimento disponível da economia. A sua tese punha o acento tónico nas despesas de investimento, ciente que estava no efeito multiplicador deste na criação de riqueza. Keynes atacava então o princípio do equilíbrio orçamental, defendendo o aumento do défice público para financiar o estímulo à economia, défice esse que seria pago quando esta entrasse em expansão e se verificasse por via disso um crescimento das receitas fiscais.
A história das últimas décadas veio demonstrar que as teorias keynesianas constituíram um formidável sustentáculo teórico para justificar a indisciplina financeira de muitos governantes. A possibilidade de definir a política fiscal e de dispor das correspondentes receitas, transformou-se rapidamente num maná para políticos menos escrupulosos. Rapidamente se passou a fazer a apologia da despesa pública latu senso e não apenas enquanto investimento, sempre com objectivos muito nobres, intuitivos e socialmente aceites. Daqui emergiu aquilo que hoje é conhecido por nomes pomposos como políticas sociais, políticas de combate à pobreza, políticas de rendimentos, políticas de juventude e por aí fora. Facilmente se consagrou a “obrigatoriedade” de o Estado intervir aos diversos níveis da vida do cidadão e, aquelas “políticas”, constituem hoje argumentários eleitorais presentes em qualquer programa partidário e justificação para promessas de maiores despesas futuras.
A justificação racional radica na existência de um terrível fenómeno que Medina Carreira, com muita propriedade, definiu como o “Partido do Estado”. Este é constituído hoje em Portugal por cerca de 4,5 milhões de pessoas umbilicalmente dependentes do orçamento de Estado, e que se repartem entre funcionários públicos, reformados do regime geral da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, desempregados e beneficiários do chamado Rendimento Social de Inserção. Estamos a falar de um enorme grupo de pessoas pouco ou nada produtivo, com tendência para crescer e que se apropria de partes cada vez maiores da riqueza gerada pelos “produtivos”, estes com uma alarmante tendência a minguarem. Acontece que a maioria destes 4,5 milhões também vota e não há político que em campanha ou no governo se atreva a pôr em causa os seus “direitos adquiridos”. Certo é que, aquele enorme contingente, absorve hoje cerca de 80% das receitas fiscais e é impensável, pelo menos no que respeita às pensões de reforma, que o Estado algum dia deixe de assumir as suas responsabilidades.
Ou seja, o nosso problema económico fundamental reside hoje no excesso de despesa pública, a qual tem de baixar significativamente para não comprometer a sustentabilidade financeira da Segurança Social. Daí que, efectuar campanhas eleitorais em que se promete mais despesa amanhã em troca do voto de hoje, denota desde logo uma enorme irresponsabilidade. Num futuro próximo, face à impossibilidade do cumprimento de tais promessas, é a credibilidade dos políticos e a própria estabilidade governativa que sairão a perder.
Até agora, não se viu nenhum Partido a defender medidas consistentes que permitissem uma redução da despesa pública. Muito pelo contrário, a maioria, se não a totalidade das medidas propostas, implicam sempre maiores gastos públicos.
Eu não estou muito certo da imediata ostracização de um Partido que, de forma responsável e consistente, se apresentasse ao eleitorado com um projecto de sacrifícios para um ou dois mandatos. Na actual conjuntura, este hipotético Partido seria o único sério e a falar verdade. E se, por hipótese utópica (???) ele fosse vencedor, teria carta branca e a obrigação de implementar a política antipática e de rigor que o País há muito necessita.
Eu julgo que existem duas razões de fundo para estas posturas recorrentes, uma de cariz filosófico, outra de natureza pretensamente mais racional.
A “razão filosófica” remete para as teorias keynesianas que se impuseram no pós-guerra ao nível das políticas governamentais. John Maynard Keynes, o pai daquelas teorias e talvez o economista mais influente do século XX, foi quem primeiro advogou a utilização do orçamento do Estado como instrumento de estabilização económica. A sua tese fundamental defende que, face a uma situação económica recessiva em que os agentes económicos se abstêm de consumir e de investir, deve o Estado substituir-se a eles e aumentar a chamada procura agregada através da despesa pública. Abram-se buracos nas ruas para voltar a tapá-los, é uma conhecida máxima de Keynes que procurava simbolizar a necessidade do investimento público para dessa forma criar empregos e aumentar o rendimento disponível da economia. A sua tese punha o acento tónico nas despesas de investimento, ciente que estava no efeito multiplicador deste na criação de riqueza. Keynes atacava então o princípio do equilíbrio orçamental, defendendo o aumento do défice público para financiar o estímulo à economia, défice esse que seria pago quando esta entrasse em expansão e se verificasse por via disso um crescimento das receitas fiscais.
A história das últimas décadas veio demonstrar que as teorias keynesianas constituíram um formidável sustentáculo teórico para justificar a indisciplina financeira de muitos governantes. A possibilidade de definir a política fiscal e de dispor das correspondentes receitas, transformou-se rapidamente num maná para políticos menos escrupulosos. Rapidamente se passou a fazer a apologia da despesa pública latu senso e não apenas enquanto investimento, sempre com objectivos muito nobres, intuitivos e socialmente aceites. Daqui emergiu aquilo que hoje é conhecido por nomes pomposos como políticas sociais, políticas de combate à pobreza, políticas de rendimentos, políticas de juventude e por aí fora. Facilmente se consagrou a “obrigatoriedade” de o Estado intervir aos diversos níveis da vida do cidadão e, aquelas “políticas”, constituem hoje argumentários eleitorais presentes em qualquer programa partidário e justificação para promessas de maiores despesas futuras.
A justificação racional radica na existência de um terrível fenómeno que Medina Carreira, com muita propriedade, definiu como o “Partido do Estado”. Este é constituído hoje em Portugal por cerca de 4,5 milhões de pessoas umbilicalmente dependentes do orçamento de Estado, e que se repartem entre funcionários públicos, reformados do regime geral da Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, desempregados e beneficiários do chamado Rendimento Social de Inserção. Estamos a falar de um enorme grupo de pessoas pouco ou nada produtivo, com tendência para crescer e que se apropria de partes cada vez maiores da riqueza gerada pelos “produtivos”, estes com uma alarmante tendência a minguarem. Acontece que a maioria destes 4,5 milhões também vota e não há político que em campanha ou no governo se atreva a pôr em causa os seus “direitos adquiridos”. Certo é que, aquele enorme contingente, absorve hoje cerca de 80% das receitas fiscais e é impensável, pelo menos no que respeita às pensões de reforma, que o Estado algum dia deixe de assumir as suas responsabilidades.
Ou seja, o nosso problema económico fundamental reside hoje no excesso de despesa pública, a qual tem de baixar significativamente para não comprometer a sustentabilidade financeira da Segurança Social. Daí que, efectuar campanhas eleitorais em que se promete mais despesa amanhã em troca do voto de hoje, denota desde logo uma enorme irresponsabilidade. Num futuro próximo, face à impossibilidade do cumprimento de tais promessas, é a credibilidade dos políticos e a própria estabilidade governativa que sairão a perder.
Até agora, não se viu nenhum Partido a defender medidas consistentes que permitissem uma redução da despesa pública. Muito pelo contrário, a maioria, se não a totalidade das medidas propostas, implicam sempre maiores gastos públicos.
Eu não estou muito certo da imediata ostracização de um Partido que, de forma responsável e consistente, se apresentasse ao eleitorado com um projecto de sacrifícios para um ou dois mandatos. Na actual conjuntura, este hipotético Partido seria o único sério e a falar verdade. E se, por hipótese utópica (???) ele fosse vencedor, teria carta branca e a obrigação de implementar a política antipática e de rigor que o País há muito necessita.
(*) Publicado originalmente no "O Comércio do Porto" em Fevereiro de 2005
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