No início deste ano foi publicado a versão portuguesa do livro “Thinking Fast and Slow” de Daniel Kahneman, prémio Nobel de economia em 2002. Daniel Kahneman, psicólogo de formação, é considerado um dos fundadores da Economia Comportamental, área que tenta conjugar a economia com a psicologia, pretendendo dessa forma obter uma teoria mais abrangente e “realista” do comportamento humano. Os seus contributos mais relevantes relacionam-se com enumeração de heurísticas que explicam o comportamento das pessoas em ambientes de incerteza e que estão na base de erros graves e sistemáticos, e na identificação da aversão à perda como um dos factores mais relevantes na explicação do comportamento humano (aversão à perda que é inconsistente com a teoria tradicional económica, que tem como pressuposto fundamental a racionalidade dos seres humanos). Num dos capítulos do livro, Daniel Kahneman analisa a questão de como as pessoas avaliam retrospectivamente as suas experiências (por exemplo, um concerto, uma noite de convívio com a família ou amigos, uma cirurgia, umas férias,…). A conclusão fundamental de Daniel Kahneman é que numa experiência há dois momentos cruciais, o pico e o final, que condicionam fortemente a memória das pessoas sobre as suas experiências. Muito mais do que a duração e a sensação de prazer ou desprazer durante uma experiência, as avaliações retrospectivas são fortemente dependentes de dois momentos singulares – o pico e o final.
Estamos a cerca de um ano das eleições autárquicas. Devido à lei de limitação de mandatos há muitos presidentes de câmara que não se podem candidatar. O concelho do Porto é um desses concelhos. Assim, é crucial fazer uma avaliação do desempenho do PSD nestes três mandatos, como um primeiro passo para determinar se o projecto político que o partido deve apresentar em 2013 deverá ser ir na linha da continuidade ou da ruptura com os últimos três mandatos. Utilizando os ensinamentos de Daniel Kahenman, por forma a tentar apurar a avaliação que maioria dos eleitores do Porto fazem da governação da cidade, acho que só podemos concluir que é urgente a apresentação de um programa de ruptura, nomeadamente com os últimos dois mandatos.
Quando se analisam os três mandatos, será unânime afirmar que o melhor foi o primeiro. Foi um mandato com muitas coisas boas. Desde logo, a nova cultura e práctica de rigor na gestão do orçamento camarário, adaptando os gastos às receitas. Tivesse o país sido gerido com o mesmo rigor, e muito provavelmente não teria havido necessidade de pedir ajuda internacional à troika. Em segundo lugar, o não ter medo de enfrentar alguns poderes da cidade, seja ao nível do futebol, da cultura, da comunicação social. É memorável a reforma feita, por exemplo, no Teatro Rivoli. Este espaço representava um custo brutal para o erário camarário (cerca de 2,5 milhões de eruos/ano), funcionado como uma coutada de uns poucos que viviam à custa de todos os outros. Importante, também, a aposta na requalificação dos bairros sociais da cidade, com destaque para o Bairro de João de Deus. No Porto, cerca de um quarto da população vive em bairros sociais, pelo que a sua recuperação foi uma decisão corajosa e justa. A criação da SRU (Sociedade de Reabilitação Urbana), pela inovação que trouxe (terá sido a primeira no país), e pelo que significava (uma aposta muito clara na reabilitação da baixa da cidade), trouxe um dinamismo que se julgava impossível de concretizar. Por fim, a gestão e conclusão de todo um conjunto de obras que tinham sido programadas para Porto-Cidade Europeia da Cultura 2001, cujos atrasos muitos custos representaram para o concelho. Foi, sem dúvida, um primeiro mandato inovador e cheio de boas ideias e grandes concretizações, representando claramente um projecto para cidade totalmente diferente do que tinha sido a gestão pelo PS desde 1989.
O segundo mandato começou com um sinal preocupante, o afastamento do vice-presidente do primeiro mandato, nunca tendo havido uma explicação pública convincente dos motivos que levaram a tal decisão. Se é certo que durante os dois mandatos seguintes houve a continuação de alguns projectos iniciados no primeiro, globalmente os resultados ficaram bastante aquém das expectativas. Um dos principais projectos, a demolição do Bairro do Aleixo e a reabilitação daquele espaço, está completamente parado. Já em 2008, durante o segundo mandato, este projecto foi apresentado como sendo uma mais-valia crítica para a cidade. Passados mais de quatro anos, e faltando um para o fim do terceiro mandato, apenas uma torre foi demolida. Relativamente à reabilitação do mercado do Bolhão, após dois projectos, um concurso, um acordo com a empresa vencedora, a anulação desse concurso e do contrato assinado, tudo continua na mesma. Por fim, a reabilitação da Baixa. Ao fim de onze anos, são poucos os prédios reabilitados, com um impacto negligenciável ao nível de novos moradores nesta zona nobre da cidade. A concretização ficou muito longe do esperado e desejado. Por outro lado, o novo dinamismo da baixa deve-se muito ao Aeroporto Sá Carneiro (ASC) e à empresa Ryanair (passe a publicidade). Refira-se, aliás, que no tocante ao ASC, embora não seja responsabilidade da cidade, pela sua importância para toda a região norte, a defesa de uma gestão autónoma deveria ter sido assumida afincadamente pelo actual presidente.
Em conclusão, o pico da gestão camarária foi o primeiro mandato, que tem o problema de já ter sido há muito tempo. Por outro lado, o final tem ficado muito aquém do esperado com uma clara tendência descendente. Utilizando os ensinamentos de Daniel Kahenma, só podermos concluir que a avaliação global do eleitor da cidade do Porto não deverá ser a mais positiva para o PSD. Por isso, a necessidade de apresentar um projecto político forte e inovador, que aproveite tudo de bom que foi feito, mas que apresente uma ideia diferente para a cidade.
Felizmente, o PSD é um partido muito rico em pessoas, pelo que não é necessário gastar muito tempo na procura de quem poderá dirigir esse projecto. Basta atravessar a ponte e temos a resposta a essa questão.
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