segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Debate "O ESTADO DA ECONOMIA PORTUGUESA E AS SAÍDAS PARA A CRISE", com o Dr. João Oliveira

Decorreu em Dezembro mais um excelente jantar/debate, desta vez sobre a Economia Portuguesa, com grande participação, de forma animada e esclarecedora. Foi orador principal o Dr. João Oliveira, ex-Presidente do Banco Português do Atlântico.

Mais um êxito, que é já uma imagem de marca do Porto Laranja.















O Dr. João Oliveira começou por alertar, em jeito de diagnóstico, que “a crise é grave e está para durar – As poupanças constituídas para a vida estão perdidas, o desemprego cresce, os activos desvalorizaram-se mas as dívidas permanecem nos balanços das famílias e das empresas”.

Entende, por isso, que “os efeitos foram brutais e as soluções desequilibradas”. Enquanto os Bancos foram salvos pelo Governo, as famílias viram-se obrigadas a reavaliar a utilidade das despesas e a renegociar as dívidas com os Bancos com o risco da revisão do preço e das condições dos contratos.

Para o Dr. João Oliveira, a dívida líquida ao exterior é muito elevada - o financiamento das renovações e dos saldos negativos da BTC tem limites e os yields tendem a aumentar.

O consumo diminui porque as dividas (excessivas) tem de ser pagas com rendimentos, o Investimento não cresce enquanto houver capacidade produtiva não utilizada e as Exportações estão dependentes da procura externa (retraída), de organizações competitivas, de produtividade, de trabalho qualificado e ajustado às necessidade de um desenvolvimento sustentado para o futuro.

Quanto à actividade financeira do Estado, advertiu que a sustentabilidade das finanças públicas não é compatível com défices persistentes das contas públicas e que o aumento da dívida pressupõe a confiança dos tomadores. Defende, num plano temporal credível e prudente, o ajustamento fiscal – mais receita (promovendo o crescimento económico, com melhor formação, melhor aproveitamento de recursos disponíveis, utilização imediata dos factores terra e trabalho e correcção das bases tributárias) e menos despesa (conferindo entitlement com justiça e equidade, simplicidade, eficiência e sem desperdício e gerindo os recursos materiais com proveito, eliminando os elevados défices no sector empresarial do Estado) e a efectiva responsabilidade pela execução e controlo do plano, da despesa e da dívida.

Julga que a consolidação financeira é inevitável. “No curto prazo a despesa vai continuar a subir para atender a problemas de crescimento económico e de coesão social e no médio e longo prazo é necessário vencer o carácter estrutural do défice das contas públicas e os desafios de elevados e crescentes custos com a saúde e pensões de reforma, que vão marcar negativamente o futuro das populações”.

Em matéria de impostos, fez várias considerações: “Não existe margem no envelope fiscal; Não se deve financiar com dívida o que deve ser pago com imposto; Mas a prudência não aconselha o aumento de impostos; Os impostos especiais devem ser fundamentados e objecto de utilização específica; As taxas e o utilizador pagador não devem ter sabor nem odor a imposto.”

Segundo o Dr. João Oliveira, a carga fiscal tem de ser suficiente, mas limitada pelo razoável e suportável, de modo a garantir às famílias condições de vida e de bem estar, com mínimos de dignidade e uma poupança voluntária ao longo da vida para uma reforma digna que o Estado já não garante.

Por seu turno, julga que a política é vulnerável ao mito do contrato social.
“Os Estados reagem sempre com atraso às mudanças e não tornam possível o que é necessário no tempo certo. Em mercados globais e liberalizados a adaptação às mudanças obriga a rever a interface entre o sector público e o sector privado, valorizando a família como célula do tecido social e consertando a garantia da liberdade de opção e de escolha com o sentido da responsabilidade pessoal e social, como alternativa ao paternalismo do Estado.”

Entende por isso essencial a ajuda de um verdadeiro sistema fiscal – justo, simples e claro, que se revele pela lógica da necessidade e não pela lógica do estatuto pessoal, que identifique necessidades familiares e seja ponto de partida para se saber quem pode e quem não pode trabalhar, com objectivos de economia e de eficiência na despesa, na solidariedade, e no incentivo ao desenvolvimento de identidades, capacidades e potencialidades pessoais que se revelem e encontrem na acção responsável.

Um sistema fiscal bem enquadrado implica políticas, regras e instrumentos adequados, medidas activas de promoção do trabalho, de utilização de recursos humanos e materiais inactivos e promoção da produtividade, ao mesmo tempo que elimina e/ou substitui incentivos e benefícios fiscais, ou outras ajudas atípicas e avulsas.

O combate à dívida e a promoção do crescimento económico não dispensam a existência de instituições financeiras criativas e competitivas, abertas e dinâmicas na promoção da poupança e satisfação de necessidades de investidores e de clientes, com sentido de razoabilidade e de equidade e a recusa de práticas de oportunismo contratual. Essas instituições financeiras devem ser capazes de mostrar competência e valor nos modelos de transformação de dívida de curto prazo em crédito a médio e longo prazo e na alocação do capital onde ele é mais bem utilizado, medida pela probabilidade de reembolso, com objectivos, processos e instrumentos orientados para a economia, numa relação de confiança recíproca e de médio prazo com clientes.

A concreta e efectiva responsabilidade assumida pelos órgãos de governo das instituições financeiras deve ser traduzida em informação acessível, completa, simples, clara e transparente sobre a situação financeira e as condições de exploração, de modo a conferir confiança ao mercado, que é condição da liquidez.

O Dr. João Oliveira entende que a economia de mercado continua a ser a melhor forma de criar riqueza para melhorar condições de vida e de bem-estar. No entanto, adverte que os riscos têm de ser assumidos nos modelos de negócio através de capitais próprios idóneos e suficientes, com limites para os atípicos. Os capitais próprios assumem assim os desvios entre o previsto e o efectivo.

No caso da banca, referiu que “se é demasiado importante para poder falir, também é demasiado importante para poder ser bem administrada e bem controlada”.

Admite que os riscos são maiores em mercados globais e liberalizados e entende, por isso, que se torna crucial defender não só a estabilidade dos mercados financeiros, mas também a competitividade, assente numa sã concorrência global e local, baixando o preço da função financeira e eliminando os lucros supra normais, que tendem a distorcer a gestão e a afectação de proveitos e de resultados.

Em nome da transparência, defende que depositantes e outros credores tenham perfeita consciência do grau de risco implícito em dívida bancária e dos produtos financeiros que não beneficiem de garantia explícita. Esse risco “tem de ser bem apresentado, bem compreendido e nunca escondido. A transparência dos preços e uma boa compreensão dos novos produtos e serviços financeiros traduzem confiança no saber e na integridade intelectual e moral de quem os vende, evitando assim que uma boa ideia seja mal aplicada e que se confundam más práticas com boas práticas. Quem assume o risco tem direito a informação completa e oportuna que impõe maiores e novas exigências de cultura financeira, para ter investidores bem informados, conscientes dos riscos assumidos e implícitos nos produtos oferecidos”.

Na negociação de produtos financeiros, o Dr. João Oliveira distingue a função venda da função conselho. “A função venda tem estado subordinada aos objectivos e à maximização dos proveitos de operadores e vendedores, enquanto a função conselho não pode continuar ausente e exige padrões mínimos de competência, ética e responsabilidade, para que possa ser orientada com objectividade e rigor para as necessidades e desejos do investidor.

A regulação é necessária, adianta com certeza. “É bem público, assente na confiança; tem de ser prudencial, comportamental, efectiva e não pode ter espaços em branco – a informação é fundamental. No processo de regulação, o poder e a autoridade são menos direitos e mais responsabilidade e esta converte-se em obrigação de serviço público e de interesse geral. Para conferir confiança ao mercado a regulação tem de se revelar através de regras estáveis e bem conhecidas, em oposição às regras ad hoc que conduzem à tirania do Estado. A regulação não pode ser falaciosa nem substitui vícios. É um processo que nunca evolui ao ritmo da transformação e crescimento das economias empresariais. Torna-se importante, para além da micro, a macro supervisão prudencial com toda a informação – da dívida, da oferta monetária, dos preços e câmbios, dos activos, da Banca… As crises são diagnosticadas pelos seus sintomas, mas o diagnóstico exige atenção e saber”.

Quanto à supervisão, julga que esta “tem de estar subordinada a critérios de elevada competência e capacidade de avaliação de riscos e sintomas que os acompanham, com real e efectiva independência e com exclusão da monocultura intelectual, que gosta das regras ad hoc e que, para gerir interesses eleitoralistas prefere organizações pouco abertas e pouco transparentes, em mercados crescentemente globais a supervisão tem de estar imune a pressões políticas de ambíguos e discutíveis interesses nacionais”.

A qualidade da regulação revela-se nos instrumentos que utiliza e na capacidade para antecipar e controlar riscos, eliminar as causas e adoptar soluções rápidas em situações de crise assim como na forma como colabora com os desafios da inovação e como evita ou exclui quem gosta de estar e de se mostrar para beneficiar de vantagens e privilégios oferecidos pelos mercados, mas não gosta da sujeição a deveres e obrigações implícitos nas funções do verdadeiro e eficiente operador financeiro.

A regulação tem custos que elevam o peso da função financeira nas contas das famílias e das empresas. Compete aos regulados tornar mínimos os custos da regulação através de modelos de negócios eficientes e transparentes, que possam conferir confiança à regulação e atractividade aos mercados.

É no mínimo imoral consentir na privatização de proveitos e na socialização de prejuízos. No entanto, quando falha a moral, a integridade e a ética, são irrelevantes os ajustamentos mecânicos em áreas que abrangem o exercício do poder e da autoridade, as qualificações de executivos, o comportamento de grandes investidores e institucionais que se movem na política e na economia.

Segundo o Dr. João Oliveira, esta crise global não será a última - Bubble tende a ser igual a bull - Os sintomas continuam presentes - os Balanços desequilibrados e desajustados; os Interesses ajustam-se em diferentes modelos de negócios e de processos; As funções financeira e comercial superam e afectam os resultados das actividades produtivas – que o mercado por si só não corrige; As organizações internacionais apenas se notam em situações de crise. E os efeitos globalizam-se e exprimem-se pela falência intelectual e moral dos que têm o dever de promover os valores que fazem os mercados funcionar, mas preferem aproveitar as oportunidades e o jogo das crises como factores de negócio. Beneficia o especulador profissional, o intermediário financeiro e operadores em Bank’s trading books; Perde o normal investidor, que tem de existir para comprar no momento errado: pode comprar bom, mas não compra bem; Os reguladores nacionais continuam ausentes e os globais não existem.

Não obstante todos os estudos, todas as declarações, todos os propósitos, todas as medidas e regras que venham a ser aprovadas, este tempo não parece ser diferente do tempo das crises anteriores.

O Dr. João Oliveira defendeu o valor das regras, uma melhor afectação de recursos para evitar terra não cultivada e mão de obra inactiva, e um sistema de falência próprio, com justiça curta de baixo para cima e muito rápida de cima para baixo.

O valor das regras - As regras têm de se exprimir e revelar-se em comportamentos com impacto positivo na sociedade e nas suas organizações, na economia empresarial e na administração pública. È importante estabelecer regras com o sentido da eficácia na sua aplicação, sem os vícios do presente, que promovam e identifiquem os líderes do futuro pelos elevados padrões de Integridade e dimensão moral e intelectual, pelo sentido da ética da responsabilidade e pelo respeito por si próprio e pelos outros. As Regras exprimem-se pela cultura e pelo valor das escolas.

Uma melhor afectação de recursos para evitar terra não cultivada e mão de obra inactiva - Na distribuição do resultado produtivo dos processos de liberalização e de globalização dos mercados têm resultado fortes benefícios para as funções distribuição e financeira em detrimento das actividades agrícola e industrial.
Os mecanismos de mercado por si só não corrigem as distorções e tendem a agravá-las. A habitação e a alimentação legitimam a verdade nas políticas agrícolas e aproveitamento do uso da terra.

Sistema de falência próprio e justiça curta de baixo para cima e muito rápida de cima para baixo (área crítica) - Que se distinga pela força coerciva das normas, para prevenir situações de falência, o risco moral e potenciar a confiança dos investidores; para permitir a reabilitação do viável, operações de cisão e de destaque e a liquidação do inviável; em processo de reestruturação credível, rápido, flexível e económico, para a defesa de valor, com a alocação dos recursos nas ou em actividades mais rentáveis e produtividade acrescida; com administração eficiente; e controlo específico dirigido aos prazos, benefícios e custos dos processos a adoptar; e prioridade para as reclamações dos investidores e credores, para que todos saibam onde vão situar-se.

Por fim, o Dr. João Oliveira deixou uma receita: mudar de vida e passar à acção com o estímulo da criatividade e da diferença. A informação, o conhecimento e sistemas computorizados tornam mais eficientes as plataformas de negociação e desafiam «novos» operadores e o dinamismo e o bom conselho da oferta para informar, explicar e mostrar as vantagens e os riscos de novos produtos, e, com participantes responsáveis e mais informados, os mercados ganham eficiência, que se revela no grau de satisfação dos investidores. Mas com regulação atenta, supervisão em atitude e acção pró-activa, com saber e elevado sentido dos riscos da actividade financeira.

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